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Carta de apoio às mulheres Sanöma/Yanomami (5-30-20)

Carta de apoio às mulheres Sanöma/Yanomami

Laboratório Matula

5-30-20

Nós, pesquisadoras/es do Laboratório Matula, recebemos a notícia de que, neste último mês, indígenas mulheres do povo Sanöma tiveram três bebês que morreram de covid, essas mortes não foram computadas pela SESAI e ao mesmo tempo os corpos não retornaram a suas comunidades para a realização da cerimônia funerária. A resposta da SESAI é que daqui a três anos, as cinzas dos corpos retornarão para a comunidade. Para as indígenas do povo Sanöma, que vivem no norte da Terra Indígena Yanomami, não realizar a cerimônia funerária significa ter a presença do morto entre eles, pois esse não finalizou sua metamorforse total, não alcançou seu novo local de moradia e paira entre os seus, buscando levar outros com eles, o que aos olhos deles é uma violência. Nas cerimônias funerárias, eles cremam seus mortos e em meio a lamentos, relembrando a vida da pessoa que faleceu, as interações que manteve. E os sentimentos provindos dessas interações significam pessoalizá-lo, o que, ao longo da cerimônia funerária, deverá ser transformado em outro. Por meio do processo de “relembrar para esquecer”, a cerimônia funerária precisa finalizar com as marcas do morto, esquecê-lo, apagá-lo e, ao mesmo tempo criar exaustivamente sua pessoalidade, a singularidade de sua corporalidade. Ao final da cerimônia, esse se torna outro e segue para sua nova morada.

No caso das mulheres Sanöma, sobressai aqui a dor da indígena mulher nesta pandemia que deixa os corpos de seus filhos e sem possibilidade de negociar os termos das cerimônias de encerramento desta vida, o que viola seus direitos enquanto povo. Essa cena se repete em vários locais do Brasil, mas, qual o peso desta dor para uma indígena mulher, que não domina o português, encontrase distante de sua rede de apoio e aguarda para saber se está contaminada? Qual a possibilidade de ter sua fala ouvida, de ter sua experiência sobre a morte compartilhada e decidida? Concordamos que as formas de contágio são múltiplas e de grandes riscos, mas há ainda algumas perguntas a serem feitas: é possível ser transparente, se abrir para um diálogo, compartilhar conhecimento e decisões.? Quais critérios éticos, iremos viver nesta pandemia? Essa pandemia escancara a desigualdade social e o que era normalizado. A infraestrutura dos serviços públicos se omitiu para essa parcela da população, os riscos das mortes dos filhos e suas mães indígenas se agudizam. E vigora a paralisia para a ação. As mulheres Sanöma são a força dessa mulher indígena, do território, da floresta, da roça, do alimento, dos rios, que manejam para cuidar da vida, merecem respeito, admiração e cuidado por parte do Estado. O laboratório Matula apoia as mulheres Sanöma na busca por informações, transparência e compartilhamento de decisões.

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